segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Uma pauta do bem

Turismo acessível: Pessoas com deficiência também querem viajar

Por Jailza Valença e Renata Lundgren

Sair da rotina, conhecer novos lugares e culturas, divertir-se, comer em bons restaurantes, participar de eventos são fatores que motivam a escolha de um destino para viajar; mas não são os únicos. Questões de ordem financeira, pessoais e de preparo do local para receber o turista também influenciam na decisão por determinado roteiro. No caso de pessoas com deficiência, planejar uma viagem vai muito além dos seus interesses e possibilidades. É necessário saber se a cidade possui adaptações que permitam recebê-las.

O turismo é uma das atividades econômicas que mais cresce no mundo e representa o movimento de pessoas do seu lugar de residência para outro de interesse. Na teoria, esse é o conceito geral do termo, mas na prática, para quem possui algum tipo de limitação física ou mental, essa explicação pode ser interpretada como
a realização de viagens para local diferente da sua moradia e que permita esse deslocamento. “É frustrante pensar que não posso viajar, pois a maioria dos lugares não são acessíveis aos cegos, o que me impede de desfrutar do lazer e fazer deslocamentos sozinha”, lamenta a professora aposentada, Euricléia Trajano.
           
Qual seria, então, a alternativa para mudar essa realidade? Como permitir que todo cidadão usufrua dos serviços turísticos? A solução está na palavra-chave: acessibilidade. Esse termo, aparentemente tão complexo, pode ser traduzido como a possibilidade de uma mulher grávida embarcar no ônibus (e passar pela roleta) sem nenhuma dificuldade; um cego cruzar a rua sozinho orientado pelo sinal de alerta do semáforo; um cadeirante circular, por conta própria, pela cidade; um surdo ter os filmes no cinema apresentados em libras. Acessibilidade, portanto, é a garantia plena do direito de ir e vir.

Uma forma de permitir que todas as pessoas tenham acesso aos mais diversos espaços está na
construção de meios físicos com base no conceito de desenho universal. Segundo o engenheiro civil, Alexandre Whatley Dias, a expressão refere-se ao projeto de ambientes, equipamentos e serviços que possam ser usados por todos, sem necessidade de adaptação específica para pessoas com deficiência. “O desenho universal deve ser totalmente aplicado às cidades que desejam explorar o turismo, pois elas têm que estar preparadas para receber todo tipo de gente, sem nenhuma distinção”, enfatiza.
Essa nova concepção dos lugares, projetados para receber os indivíduos independente de suas habilidades, tem uma nomenclatura própria no setor turístico, conhecida como turismo acessível e/ou inclusivo. De acordo com
o professor do curso de turismo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco (IFPE), Gustavo Estevão, isso não representa um segmento específico, como turismo de sol e praia ou turismo cultural, mas uma adequação de todos os serviços e produtos turísticos com o objetivo de atender as exigências de qualquer cliente.

CONSUMIDORES EM POTENCIAL

Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) mostram que no mundo, aproximadamente 650 milhões de pessoas possuem alguma deficiência. No Brasil, segundo o Censo 2000 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), são quase 30 milhões de habitantes. Em Pernambuco os números apontam para 17,3% da população. A indústria do turismo, atenta a esses números, percebeu uma demanda em potencial para os seus negócios.
          
“Em qualquer lugar do mundo, em qualquer faixa de idade, há pessoas com deficiência e mesmo com as suas dificuldades, elas querem ser turistas e estão dispostas a pagar pelos serviços”, ressalta o professor do curso de turismo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco (IFPE), Gustavo Estevão. Diante deste cenário alguns destinos estão direcionando suas ações para conquistar esse novo público. “Com a competitividade no setor turístico mundial buscar um diferencial competitivo no mercado é fundamental para conquistar e fidelizar clientes”, destaca o economista, Sérgio Paixão.
           
Países como Espanha
, Canadá, França e Estados Unidos, atentos às novidade do mercado, decidiram empreender na área do turismo inclusivo. A estrutura criada por eles, para atender às necessidades dos portadores de deficiência, é referência para os demais lugares. A oferta de serviços disponibilizada por esses países inclui toda uma preocupação com as normas de acessibilidade e qualidade no atendimento. “Em algumas cidades do mundo, já é possível desfrutar de serviços turísticos acessíveis. Citando alguns exemplos temos pacotes de turismo de aventura para cadeirantes, museus voltados para cegos, aluguel de carro adaptado, hotéis projetados com base no desenho universal entre outros”, acrescenta o geógrafo e tecnólogo em gestão de turismo, Edvaldo Dias.
           
No Brasil pequenas iniciativas no âmbito da acessibilidade no turismo já podem ser observadas, mas o país ainda não possui estrutura suficiente para atender os deficientes de maneira segura e confortável. Mesmo com orientações de leis e decretos de acessibilidade turística, poucos são os destinos brasileiros que
estão se adequando a essas exigências legais. “O Brasil está engatinhando na questão do turismo acessível e falta muito para dar os primeiros passos”, comenta a técnica em turismo, Olga Fernandes.
Marize mostra algumas adaptações de sua casa
Esses pequenos detalhes ajudam muito no seu cotidiano
           
A bacharel em teologia, Marize Barros é uma amante das viagens e o fato de usar uma cadeira de roda não a impede de aproveitar bons momentos de lazer e turismo. “Na infância tive paralisia e perdi o movimento das pernas, mas isso não é justificativa para eu ficar presa em casa”, explica. Ela já visitou vários estados no Brasil e recomenda alguns lugares que já tem uma preocupação com a acessibilidade. Brasília (DF), João Pessoa (PB), Rio de Janeiro (RJ), Belo Horizonte (MG), Curitiba (PR), Bonito (MS), Socorro (SP) e São Carlos (SP) são exemplos indicados por Marize. Há, sobretudo, um destaque para Curitiba que ela afirma ser a cidade mais bem preparada para receber os deficientes. “O Brasil está começando a repensar a acessibilidade, mas para uma pessoa como eu ficar totalmente independente ainda falta muito”, ressalta.


BARREIRAS AO TURISMO

O tecnólogo em gestão de turismo, Josemberg Francisco, tem um tipo de tetraplegia que a medicina não consegue explicar. Ele nasceu normal, até que aos 18 meses de vida começou o problema que os médicos avaliam como uma consequência da incompatibilidade de sangue entre ele e a sua mãe. A tetraplegia lhe tira a coordenação motora e a força, mas ele ainda tem uma certa sensibilidade no corpo. Com a ajuda de um acompanhante e de uma cadeira de rodas Josemberg pode realizar suas atividades cotidianas, porém enfrenta diversos obstáculos.
           
Em um passeio com a nossa equipe de reportagem foi possível conhecer de perto as dificuldades encontradas por Josemberg na prática de atividades turísticas. Em uma simples visita ao Instituto Ricardo Brennand, localizado no bairro da Várzea em Recife e, que fica a algumas ruas da casa dele, já apareceram as dificuldades que o impedia de se deslocar de forma confortável.
           
Logo na saída surge o primeiro problema: Como chegar? Qual o melhor transporte? O baixo número de ônibus adaptados fez com que fôssemos a pé e Josemberg foi conduzido pelo seu pai. A irregularidade do piso das calçadas o obriga a trafegar pela rua. Chegando ao museu, percorremos ainda quase um quilômetro da portaria até a entrada dos castelos, em chão de paralelepípedo, péssimo para quem usa cadeira de rodas. Mas como no instituto não há nenhum veículo que possa conduzí-lo, a solução foi continuar a caminhada.
           
No museu tudo correu de forma mais tranquila e confortável. Os espaços são bem mais preparados para receber os cadeirantes. As portas e corredores eram largos e havia rampas de acesso. Pequenos detalhes que se colocados de maneira inadequada podem trazer grandes transtornos aos cadeirantes. “É importante lembrar que fora a dificuldade de chegar até o castelo, o ambiente lá dentro está preparado para receber o cadeirante, mas, as pessoas cegas não tem como interagir com as obras e os surdos não têm como participar das explicações dadas pelo monitores do local”, alerta Josemberg.
           
Esse foi apenas um simulacro da realidade enfrentada pelos deficientes nos momentos de lazer e turismo. “Quando um deficiente se propõe a viajar, encontra muitas dificuldades que acabam muitas vezes desestimulando as suas experiências. Mas a democratização dos ambientes pode mudar esse cenário”, confirma Josemberg.

Confira algumas imagens do passeio:




























Obs: Matéria feita por mim e minha amiga da facul, Jailza, que ficou com nota máxima e não só pela forma e conteúdo, mas pelo espaço dado a uma boa pauta. Valeu prof. Gurgel.



Saiba Mais:


Vídeos - Pessoas com deficiência dando o seu exemplo na prática do turismo.



Um comentário:

  1. Olá Renata! Boa tarde!

    Excelente matéria! Ela será reblogada no Terra Brasilis que, desde já, está linkado ao Jornalismo do Bem.

    Grande abraço!

    ps. Você está seguindo o Terra Brasilis, mas o link de seu blog não aparece para outras pessoas. Você deve seguir publicamente para que o seu blog esteja acessível aos visitantes.

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